Sempre que leio o diário de Wesley e acompanho a descrição que ele dá para o dia 24 de maio de 1738, fico impressionado. Com muito detalhes, explicações e uma cronologia dos eventos que aconteceram em sua vida, essa descrição é como um prelúdio que Wesley faz sobre a reunião de oração, a qual ele foi com muita má vontade (ao final, veremos o texto de Wesley a respeito). Me chama a atenção que Wesley estava ouvindo um escrito de mais de 300 anos feito por D. Martin Luther, intitulado “Prefácio à Carta de São Paulo aos Romanos”. Recentemente li esse texto e gostaria de repartir algumas partes:
“Para começar, nós temos que nos tornar familiares com o vocabulário da carta e saber o que São Paulo quer dizer das palavras lei, pecado, graça, fé, justiça, carne, espírito, etc. Do contrário, não adianta lê-la.
Não se deve entender a palavra lei aqui em padrões humanos, i.e., como regulamento sobre que tipo de ações devem ou não devem ser feitas. Esta é a maneira em que se apoiam as leis humanas: satisfazem-se os mandamentos da lei com obras, não importa se o coração está ou não de acordo. Deus julga o que está no mais profundo do coração…
No capitulo 7, São Paulo diz, “A lei é espiritual.” O que isso significa? Se a lei fosse física, então ela poderia ser satisfeita com obras, mas desde que é espiritual, ninguém pode satisfaze-la, a menos que tudo que faça jorre do íntimo do coração. Mas ninguém pode dar um coração assim exceto o Espírito de Deus, o qual torna a pessoa conforme (ou como) a lei, de modo que realmente concebe um coração com o anseio pela lei e, a partir daí (de hoje em diante), faz tudo, não através do medo e da força, mas um coração espontâneo. Se o espírito não está no coração, então permanece o pecado, com aversão e inimizade contra lei, a qual é boa, justa e santa.
Capitulo 3 afirma que nenhum ser humano é justificado diante de Deus através das obras da lei. Como pode qualquer pessoa preparar-se a si mesmo para o bem por meio das obras, se não faz nenhuma boa obra, exceto com aversão e constrangimento em seu coração?
É o Espírito Santo, entretanto, quem põe tal desejo ardente de amor dentro do coração, como Paulo diz no capítulo 5. Mas o Espírito é somente dado, com, e através da fé em Jesus Cristo, como Paulo diz em sua introdução. Assim, também, a fé somente vem através da palavra de Deus, do Evangelho, o qual prega Cristo: como ele é tanto Filho de Deus e do homem, como ele morreu e ressuscitou para o nosso benefício. Paulo diz tudo isso nos capítulos 3,4 e 10.
A fé é uma confiança viva na graça de Deus; ela é tão firme, que alguém poderia morrer mil vezes por ela. Este tipo de confiança e conhecimento da graça de Deus torna uma pessoa cheia de alegria, confiante, e alegre, com considerações por Deus e todas as criaturas. Isso é o que o Espírito Santo faz através da fé, pela qual uma pessoa fará o bem a todos sem uso de força, espontânea e alegremente; ela servirá a todos, sofrerá tudo pelo amor e louvor ao Deus, que lhe tem mostrado essa graça…
Então, justiça é justamente uma fé assim. É chamada de justiça de Deus ou aquela justiça que é válida aos olhos se Deus, porque é Deus quem a dá e a considera como justiça pelo benefício de Cristo, nosso Mediador…”
Poderíamos continuar com o texto de Lutero, mas trabalha com tanta clareza os temas que fundamentam nossa fé; mas vamos agora para o Diário de Wesley e seu relato sobre essa palavra:
“À noite fui muito de má vontade até uma Sociedade, na Rua Aldersgate, onde a pessoa estava lendo o prefácio de Lutero à Epístola aos Romanos. Por volta de quinze para a nove, enquanto ele estava descrevendo as mudanças que Deus opera no coração, pela fé em Cristo, eu senti meu coração estranhamente aquecido. Senti que confiei em Cristo – Cristo apenas, para a salvação; e uma garantia me foi dada de que Ele tinha tomado meus pecados, até mesmo os meus, e tinha me salvo da lei do pecado e da morte.”
Wesley conhecia bem o Livro de Romanos: ele o lia no original e já fazia suas notas sobre o Novo Testamento. Mas, aqui, a palavra não ficou só na mente: veio para o coração. Fica claro, então, que a fé não é só intelectual, mas principalmente espiritual.
O texto e a experiência são profundos, escritos de uma maneira tão pura e simples, que não há como um coração não se aquecer. Me lembrei então de uma vez, após uma aula sobre pregação, em que perguntei ao Pastor Estêvão Canfield: “qual é o melhor método para pregar: expositivo, temático ou textual?”. Ele respondeu – “pregue com o coração aquecido”.
Tenha um mês abençoado, e seja um missionário com o coração aquecido pelo Espírito Santo.
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